Vale o Escrito

Eu amo escrever. Escrever certamente está entre as coisas que eu mais gosto de fazer. Pode até ser que não figure entre as coisas que eu faço melhor, mas faço com muito gosto. Chega a ser engraçado eu falar como gralha e um segundo depois lamentar ter dito e não escrito. E pior do que falar e não escrever é pensar e não escrever. Quando você fala ao menos alguém ouviu.

Escrever é legal, é interessante, é algo que propaga muito firmemente distinções, seja de personalidade pelo que expressa, seja de formação pelo modo como expressa. Contudo, para escrever é preciso suporte. No mínimo um papel e algo que imprima, seja um lápis, uma caneta, um hidrocor, vai lá, até um baton. Não é raro virem as idéias, a intenção e esbarrarem com a ausência de suporte.

Certa altura ouvi dizer que o Padre Anchieta, por falta de apetrechos mais apropriados, escrevia na areia. Até que as ondas levassem seus escritos havia tempo para memoriza-los. O inconveniente das marés exercitava bem a mente de tal figura. Para escrever na areia deve ser preciso concisão. Que falta tal coisa me faz! Não sei qual a maior faixa de praia do litoral brasileiro, mas sei que nela caberia, com algum esforço, qualquer coisinha corriqueira. Sim, escrevo bilhetes em papel A4!

Não é raro vermos nomes, telefones e endereços em letras toscas, em papéis mal ajambrados. A idéia é o de guardar rapidinho. Para tal feito qualquer artifício basta. De mais a mais, com o advento celular o romantismo do improviso cai por terra. Mas quando falo de escrever me refiro a versos, contos, crônicas, comentários, idéias, poemas e mais, os quais requerem recursos e algum zelo.

Confesso que não sou das criaturas que põem a escrita em prática a próprio punho. Até uso os punhos, mas quem acerta as teclas são os dedos. Embora eu não confie no computador para guardar o que escrevo, é através dele que crio um arquivo para velar meu rebento.

Ontem eu estava falando comigo ao volante. Era uma conversa ótima, a interlocutora era agradável, um pouco pedante, mas absolutamente inteligente e espirituosa. Eu precisava registrar aquela conversa, aquele momento, aquelas idéias me apareciam já quase como um texto. Tinha uma divisão bonita e encadeada de parágrafos. Diga-se de passagem, coisa que nesse texto não está a contento. Mas, enfim, perdi tudo no sopro fugaz das idéias.

Tal perda me deixou bastante atordoada. Eu bem sei que daqui um tempo eu leria e acharia uma bobeira, coisa de momento, chiclete mastigado e sem sabor, mas pra hoje era de uma pertinência insultuosa ao meu despreparo para captar e registrar o que pairou.

Imagine e tente enumerar a quantidade de vezes que você pensou algo legal e não conseguiu registrar. Mesmo que fosse pra achar uma bobeira depois de uma semana, escrever era essencial. E assim lido com a escrita, algo que cada vez mais assume importância dentro de mim. Carrego sempre uma caneta, mas confesso que espero que o acaso me ceda o papel. Nem sempre acontece.

Essa semana chegou a mim duas observações interessantes de personalidades relacionadas com a escrita. A primeira foi no filme Vinícius, em que diziam que o poeta escrevia para fugir de si, colocando o cotidiano brasileiro na métrica poética. A segunda observação foi sobre Luis Fernando Veríssimo. Numa entrevista a “Caros Amigos”. Me chamou atenção o fato de que a entrevista deveria ser uma conversa entre ele e alguns colaboradores da revista. Mas o escritor apenas consentiu em dar a entrevista caso as perguntas fossem escritas. Respondeu a todas, por escrito. É ótimo escrever até para se precaver de possíveis deslizes. Não se escreve sem pensar!

Você que acabou de me ler, porquê não tenta me escrever ao invés de guardar para si e fadar o que paira em sua mente ao esquecimento?

Comentários

Patrícia disse…
Adoro o seu blog, o seu jeito de escrever, as coisas que aborda. Sei que já deletei meus inúmeros blogs e que nem sempre tenho algo importante a postar, mas sempre que venho aqui, me encontro. Leio poucos e bons blogs, e o seu, com certeza, é um deles.


=)
Lu Ribeiro disse…
Ao volante, mesmo q tenha caneta e papel, não acho boa idéa escrever, que tal um MP4? Com a grana q vc ganhará na carreira de dançarina do poste dá pra comprar até um Ipod...

bjão
Lu Ribeiro disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
Patrícia disse…
Obrigada pelo comentário no meu blog, sei que o post não é dos mais interessantes, mas eu concordo plenamente com você: As rasteirinhas devem imperar! Eu, que resolvi fazer parte do mundo jurídico, tou tendo uma dificuldade enorme para
"subir no salto". Como ando muito de busão e passo o dia fora de casa, ainda não abandonei minhas rasteirinhas (nem quero!). Quando eu ver que a rotina vai ficar mais mansa, uma vez ou outra, quem sabe se não coloco um sapato... Nem comprei ainda, parece que era de uma coleção que já acabou.


=)
O blog vai ficar mais interessante quando eu tiver realmente algo mais importante à postar e quando uma amiga (Aninha) entrar lá de co-autora.

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