A cultura da intrusão
Se há algo que me incomoda, definitivamente, é o intrometimento. Por mais que se diga que nas grandes metrópoles as pessoas são impessoais e individuais, tudo isso não passa de conversa. O intrometimento e controle não são tão rigorosos quanto em quaisquer cidades pequenas, porém nas metrópoles são muitíssimo sofisticado, camuflado. Duvida?
Você precisa comprar um sutiã, peça bem íntima. No caso você deseja uma peça bem ousada, pra uma noite “caliente”. Você vai até uma loja de “moda íntima” (eu chamaria de loja de calcinhas, simplesmente. Mas aprendi em Friburgo que há um termo elegante pra coisa), circula e a atendente vem cheia de interesse. Esse interesse deveria ser o de vender, mas logo ela demonstra que esse é secundário. Ela pergunta se pode ajudar e você explica que quer um sutiã, de renda, vermelho. A primeira intromissão é perguntar pra quem é. De fato não interessa, já que você pode ter em mente o tamanho e isso basta. Tudo bem, você diz que é pra você. A segunda é perguntando se é pra alguma ocasião especial. Pessoalmente eu já fico com um palavrão enorme, pronto pra ser disparado, mas não fica bem se aborrecer com tão pouco. Responde-se que é pra uma noite especial. Ela prossegue a intromissão perguntando se ele gosta com mais bojo ou mais renda. Porra, quem tem que gostar sou eu. E não é só isso, ela tá jogando verde, pois não é da conta dela se é ele, pois nada impede que seja ela.
Enfim, nessa seqüência há perguntas intermináveis, uma intimidade forçada, uma amizade tão instantânea quando efêmera. Você vai até o balcão com aquela micro peça que custa muito mais do que você estaria disposta a pagar, com a sua intimidade devassada, e quando perguntada sobre a forma de pagamento opta logo pelo dinheiro, pra agilizar as coisas e minimizar o constrangimento. A atendente pergunta o seu CPF. Bem, se estou optando por pagar em dinheiro, pra quê a infeliz quer meu CPF? PELOAMORDEDEUS, já sabe quanto eu visto, já sabe que vou trocar o óleo esses dias, já sabe minha preferência sexual, se marcar bobeira já arrancou de mim até as zonas erógenas de maior eficiência, e ainda quer o CPF! Depois fica constrangida se eu convidar pra participar do programa!
Meu exemplo pode parecer caricato, mas não é. A intromissão em nossa cultura é banal. Senta num bar e você vai ver que ao lado da cordialidade e ar amistoso, que tão bem caracterizam o brasileiro, está a intromissão. A “amizade”, ou a confiança, começa ouvindo a conversa alheia. Você e um amigo falam de um problema no carro, e o camarada da mesa ao lado escutou. Ele diz que estava ouvindo sobre o problema do carro e que teve um amigo que teve o mesmo problema e, portanto, conhece um mecânico ótimo que resolve isso. Você e seu amigo naturalizam a intromissão julgando estar o sujeito interessado em ajudar. Logo todos começam a conversar. O sujeito pergunta qual a marca do carro, o ano, onde você comprou e por quanto, e pra dar um requinte ainda pergunta qual a quilometragem. E eu me pergunto: pra quê saber de tanta coisa? Eu to vendendo meu carro? E dessa deixa de carro, de mecânico, ele pergunta se eu moro perto, se eu trabalho por ali, o que eu faço, se sou casada, e aí está a sua vida exposta. Engana-se quem se acha reservado, um desconhecido que passa em qualquer lugar sem ser observado e investigado.
Se você vai numa padaria três dias numa semana o padeiro, o caixa, o atendente, todos ali te “conhecem”. Se algo ocorrer em sua vizinhança e alguém levantar suspeita que pode ter sido você o culpado por isso ou aquilo, logo aparecerão meia dúzias de pessoas que você nunca se deu ao trabalho de notar pra dizer que você parece ser boa pessoa, desce com o seu poodle, o bob, com coleira vermelha, e passeia de havaiana branca, compra duas baguetes todos os dias, e no domingo com 100gr de presunto, e sempre calmo, educado, que nunca se aborrece com nada nem ninguém.
Interessante notar que quando você não é o alvo de observação, é o observador. Vai me enganar que não fica curioso em saber o que é que o velhote da sua rua faz pra ter dois carros importados zerados. E pior, com dois carrões morando numa pocilga. Ok, talvez você alivie os vizinhos, mas adora contemplar as revistas de fofoca que flagram o ator da novela passeando com os filhos, andando de bicicleta na orla. Deve dar um ar de proximidade saber que esta ou aquela suposta celebridade tem uma vida de algum modo parecida com a sua. Da maneira que for todos observam e são observados, na cidade pequena ou na metrópole. E mais que em qualquer tempo faz sentido e deve ser seguida a sugestão de cuidarmos da nossa saúde, pois de nossas vidas tem quem cuide.
Você precisa comprar um sutiã, peça bem íntima. No caso você deseja uma peça bem ousada, pra uma noite “caliente”. Você vai até uma loja de “moda íntima” (eu chamaria de loja de calcinhas, simplesmente. Mas aprendi em Friburgo que há um termo elegante pra coisa), circula e a atendente vem cheia de interesse. Esse interesse deveria ser o de vender, mas logo ela demonstra que esse é secundário. Ela pergunta se pode ajudar e você explica que quer um sutiã, de renda, vermelho. A primeira intromissão é perguntar pra quem é. De fato não interessa, já que você pode ter em mente o tamanho e isso basta. Tudo bem, você diz que é pra você. A segunda é perguntando se é pra alguma ocasião especial. Pessoalmente eu já fico com um palavrão enorme, pronto pra ser disparado, mas não fica bem se aborrecer com tão pouco. Responde-se que é pra uma noite especial. Ela prossegue a intromissão perguntando se ele gosta com mais bojo ou mais renda. Porra, quem tem que gostar sou eu. E não é só isso, ela tá jogando verde, pois não é da conta dela se é ele, pois nada impede que seja ela.
Enfim, nessa seqüência há perguntas intermináveis, uma intimidade forçada, uma amizade tão instantânea quando efêmera. Você vai até o balcão com aquela micro peça que custa muito mais do que você estaria disposta a pagar, com a sua intimidade devassada, e quando perguntada sobre a forma de pagamento opta logo pelo dinheiro, pra agilizar as coisas e minimizar o constrangimento. A atendente pergunta o seu CPF. Bem, se estou optando por pagar em dinheiro, pra quê a infeliz quer meu CPF? PELOAMORDEDEUS, já sabe quanto eu visto, já sabe que vou trocar o óleo esses dias, já sabe minha preferência sexual, se marcar bobeira já arrancou de mim até as zonas erógenas de maior eficiência, e ainda quer o CPF! Depois fica constrangida se eu convidar pra participar do programa!
Meu exemplo pode parecer caricato, mas não é. A intromissão em nossa cultura é banal. Senta num bar e você vai ver que ao lado da cordialidade e ar amistoso, que tão bem caracterizam o brasileiro, está a intromissão. A “amizade”, ou a confiança, começa ouvindo a conversa alheia. Você e um amigo falam de um problema no carro, e o camarada da mesa ao lado escutou. Ele diz que estava ouvindo sobre o problema do carro e que teve um amigo que teve o mesmo problema e, portanto, conhece um mecânico ótimo que resolve isso. Você e seu amigo naturalizam a intromissão julgando estar o sujeito interessado em ajudar. Logo todos começam a conversar. O sujeito pergunta qual a marca do carro, o ano, onde você comprou e por quanto, e pra dar um requinte ainda pergunta qual a quilometragem. E eu me pergunto: pra quê saber de tanta coisa? Eu to vendendo meu carro? E dessa deixa de carro, de mecânico, ele pergunta se eu moro perto, se eu trabalho por ali, o que eu faço, se sou casada, e aí está a sua vida exposta. Engana-se quem se acha reservado, um desconhecido que passa em qualquer lugar sem ser observado e investigado.
Se você vai numa padaria três dias numa semana o padeiro, o caixa, o atendente, todos ali te “conhecem”. Se algo ocorrer em sua vizinhança e alguém levantar suspeita que pode ter sido você o culpado por isso ou aquilo, logo aparecerão meia dúzias de pessoas que você nunca se deu ao trabalho de notar pra dizer que você parece ser boa pessoa, desce com o seu poodle, o bob, com coleira vermelha, e passeia de havaiana branca, compra duas baguetes todos os dias, e no domingo com 100gr de presunto, e sempre calmo, educado, que nunca se aborrece com nada nem ninguém.
Interessante notar que quando você não é o alvo de observação, é o observador. Vai me enganar que não fica curioso em saber o que é que o velhote da sua rua faz pra ter dois carros importados zerados. E pior, com dois carrões morando numa pocilga. Ok, talvez você alivie os vizinhos, mas adora contemplar as revistas de fofoca que flagram o ator da novela passeando com os filhos, andando de bicicleta na orla. Deve dar um ar de proximidade saber que esta ou aquela suposta celebridade tem uma vida de algum modo parecida com a sua. Da maneira que for todos observam e são observados, na cidade pequena ou na metrópole. E mais que em qualquer tempo faz sentido e deve ser seguida a sugestão de cuidarmos da nossa saúde, pois de nossas vidas tem quem cuide.
Comentários
Cada um no seu quadrado!
Adoro ver um comentario seu la!
Namastê!
Ps: To sempre por aqui, as vezes so me falta tempo pra deixar minha marquinha! Fora q meu pc ta uma merda!
Bom Natal pra ti!
Beijocas
tudo isso serve também pra dizer que, olha, com um pequeno endereço do seu blog, vi seu rosto, vi que mora no rio e que escreve bem pra caramba, ou seja, lá vem a intromissão. foi pra entrar no clima do post mesmo, sei que não precisava de toda essa informação x)
enfim, adorei a post. morando aqui em rio branco sei exatamente como é isso. a grande diferença, como vc mesma diz, é que nas grande metrópoles é camuflado. aqui todo mundo se conhece e se acha no direito de palpitar na sua vida. felizmente são poucos que estão conseguindo me incomodar por conta disso. sempre tento não dar muita bola. o ideal é cuidar da saúde.
chega. já me estendi demais!
um grande beijo! ;*
Não é à toa que revistas como Caras e Quem vendem tanto hehe!!
Bjooooooooo!!!!!!!!!
Sua fâ incondicional!