O Pan-cada

No Rio de Janeiro só se ouve e só se fala numa única coisa: o Pan Americano. Imagino que no Brasil inteiro esteja ouvindo e falando a mesma coisa. Aliás, em outros países da América não deve ser diferente. Mas certamente o carioca é o único que fala com propriedade. Propriedade fruto das experiências recentes de ser a cidade que cedia os jogos.
Não desmerecendo atletas e delegações, não desanimando torcedores nacionais e internacionais, mas essa idéia do Rio de Janeiro sediar o Pan Americano não anda sendo feliz. O preço de sediar os jogos é o desconforto, são transtornos diários nos preparos e tenho por certo que o ápice ainda está por vir.
Gerar uma infraestrutura para abrigar um evento dessa proporção não parece viável as características do Rio de Janeiro. A cidade é maravilhosa, as praias são lindas, as paisagens deslumbrantes, os cariocas são agradáveis, mas nem tudo são flores.
O rio de Janeiro tem problemas como quaisquer outras capitais mundiais, mas um problema no Brasil é diferente de um problema no resto do mundo. No Brasil um problema raramente é algo digno de solução, no máximo de um jeitinho.
Então, se a cidade está inflada e não há espaços para construção de moradias e áreas de lazer, construímos uma vila do Pan na Zona Oeste. Remediado! Pra onde vai a merda que as pessoas irão cagar na Vila do Pan? Não interessa.
A Zona Oeste só é próxima da Zona Oeste. Há algumas formas de chegar até lá, todas complicadas. Pode-se passar pelo túnel que desemboca na Rocinha ou pela Av. Niemayer. Em ambos os caminhos contempla-se de um lado o mar e mansões, e de outro a Favela da Rocinha e/ou o Morro do Vidigal. Ambos locais até bem calmos, contudo, ai do domínio público ficar fazendo gracinhas se o tiroteio não começa! Mas isso é condicional, pois regular mesmo é só o tráfego lento, por conta da desproporção entre quantidade de carros e capacidade das pistas. Mas isso já foi solucionado. Há um pedido para que os moradores da Barra evitem sair do bairro nos dias do evento. Simples assim!
Há uma outra possibilidade que é a linha Amarela. Essa via sim é muito boa. E com um pedágio de três reais e tantos centavos não poderia ser diferente. Corta vários bairros pobres, algumas favelas, tudo calmo. Animado mesmo só trecho conhecido como Faixa de Gaza. Raras vezes passei por lá sem ser recepcionada por uma salva de tiros. Não é lenda, é tiro pra todo lado mesmo.
Mas está tudo no jeito. As ruas estão sendo marcadas com uma faixa laranja. A idéia é fazer o trânsito fluir para o Pan Americano. Os motoristas que forem pegos trafegando pelas faixas exclusivas serão multados. Coitado dos inadvertidos! Eu to me alongando no transporte rodoviário, mas vou me eximmir de comentar sobre o aéreo, férreo ou marítimo. Em relação a transporte, muito bem esclareceu a linda e estimada Martha Suplicy: Relaxa e goza. ADORO!
Não irei nem adentrar na idéia do abastecimento de produtos diversos, desde os mais básicos como água e alimentos, até os mais específicos como souvenires. Eles saem de um lugar e precisam chegar a outro. Como? Dá-se um jeito. Na madrugada tudo é possível.
Já que madrugada veio a baila, é mesmo o momento em que alguns dormem e outros trabalham. A limpeza? O efetivo da comlurb não creio ser suficiente para dar conta de zelar pela boa conservação da cidade. Voluntários!
E a saúde? Alguém acredita que não há ocorrências no Pan? Pois bem, quem pensava em tirar férias em Julho já está abraçando a causa: não tô podendo com o Pan. E não adianta apenas pessoal, pois ninguém opera milagres, o curandeirismo não é das práticas mais indicadas em hospitais. É preciso material, desde medicamentos aos de conservação. Normalmente esses são parcos nos hospitais, mas para receber o pan seria uma vergonha não ter nem gaze nem luvas descartáveis. A população carioca atura isso, mas os visitantes para o Pan não precisam.
Mendigos? Não os vejo mais! Estão limpos, banhados, e isolados, quase como Lord ingleses, dos quais se ouve falar, mas nunca são vistos. Eles são talvez uma excentricidade dessa bonita cidade que lhes recebe de braços abertos.
Violência? Tudo sob controle! Semanas em guerra no Complexo do Alemão. É pra fazer um combate efetivo ao tráfico de entorpecentes? Não exatamente. É pra deixar o pessoal sob controle, comportado, ao menos no período do Pan. Depois voltam a brincar de gato e rato. De verdade fico tranqüila mesmo, pois os policiais são tão parceiros dos traficantes que não creio que um deles faça a gracinha de estragar a brincadeira.
Mais uma vez o Brasil se destaca mundialmente. Certamente é um dos poucos países onde um tal terrorismo que assola o mundo, ou a mente de norte-americanos, não existe. É um país vaselina, sem grandes animosidades externas. Nós não temos medo de um país inimigo. Os inimigos do Brasil são criados aqui mesmo. Não é sensacional? Por que ter medo de uma ameaça externa, se internamente podemos viver harmoniosamente com nossos inimigos? É sempre bom tê-los à vista.
Eu tenho certeza que faremos um excelente Pan. O jeito consegue operar milagres, coisas inacreditáveis. Entre pequenos atrasos e leves desentendimentos, o resultado final do evento será positivo. Não tenho condições de especificar para quem. Mas em maior e menor escala haverão beneficiados. Mas por ora ando padecendo um bocado. Aos que verão as competições, boa diversão. Aos que participarão das competições, boa sorte. Aos que fazem o Pan acontecer, sucesso. Aos que não se encaixam em nenhuma dessas: paciência, muita paciência.

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