A autenticidade de "Cópia Fiel"

O cineasta iraniano Abbas Kiarostami permanece. Na sua mais recente produção, “Cópia fiel”, passa uma demão no que ouso dizer ser o supra-sumo de sua obra: a busca. Sua poética se distancia do clichê ocidental do bem e do mal. E suas produções não se encerram ao conclusivo e moral. E o preço de sua originalidade, ou heterodoxia, é se positivo a incompreensão, e se realista a intolerância.

Em “Cópia Fiél” o diretor ensaia um debate filosófico que deixa fluir um pouco do que o afeta de sua formação em Belas Artes. O personagem James Miller, interpretado por Willian Shimmel, escreve um livro que enaltece a cópia de arte. Entretanto, em conversa com Elle, interpretada por Juliette Binoche, assume que sua posição expressa no livro é menos o que pensava, e mais o que gostaria de pensar, ou seja, escreveu para convencer a si e aos outros. E entre o original e a cópia há introduções instigantes para pensar a arte entremeando com posturas e ações do cotidiano. De Jasper Johns a Andy Warhol a pop art fabricada na América é posta em um diálogo que incita à conclusão de que estão mais para o comércio e reprodução iconográfica do que para a reflexão e despojamento.

O que começa amarrado conceitualmente em diálogos nem sempre palatáveis passa para o devir, o drama, o cotidiano, a busca. Elle é ex-esposa do escritor James Miller, e a vinda dele para divulgação de um livro é a oportunidade que ela encontra para a reaproximação.

Na busca da relação “perdida” Elle conduz seu ex-marido pelos locais e rituais que deveriam simbolizar para o casal, entretanto, o símbolo e o significado não é partilhado por eles. Cada qual compreende o mundo do seu modo. E a compreensão singular do mundo torna-se incompreensão que inviabiliza a relação.

As cenas em ritmo cadente estão bastante marcadas nesta produção, assim como o desenho inteiro de caminhadas e trajetos. E há um recurso intensamente usado por Kiarostami de rodar uma cena a parte em retrovisores nos momentos de introspecção do personagem. Incita refletir sobre o tanto do passado que se projeta no presente.

Em termos poéticos e filosóficos o filme é mais uma preciosidade. Em termos comerciais, segue como pária. Dessa soma o resultado é positivo, da abertura do cinema para produções com formas e intenções diversificadas. Para os que se instigam com a experimentação, o filme é imperdível. Já para os que têm menos paciência com o diferente, vale a sugestão de um dia ousar.

Comentários

Assim com os orientais, os iranianos possuem uma forma única de ver e expressar o mundo.
Ainda não tive o prazer de assistir a nova produção de Kiarostami, mas encontra-se na lista dos anseios.
Fico muito feliz em ver Juliette mantendo sua carreira, principalmente dando continuidade em boas produções - a acompanho desde "Je vous salue, Marie".
Beijoca,
K.

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