Urbe para infanto



Manda o costume brasileiro guardar os feriados. E com tanto zelo que a véspera o e dia seguinte ao feriado se tornam um pouco feriado também. No escritório os que comparecem saem mais cedo. O setor público fica a mercê de um tal de ponto facultativo. As escolas se ajustam como podem ao calendário mínimo. E a população se organiza conforme as circunstâncias. Nesses dias "meio barro meio tijolo" calha das crianças ficarem à toa em casa, as mães ocupadas com afazeres domésticos e sem paciência, e os pais com pendências pra resolver na rua. O arranjo provável é o pai levar as crianças para a rua, e a conclusão em geral é de que a experiência não é muito boa, mas serve para pensar.

E lá se vai o pai ou a mãe para a rua com duas crianças. A caminhada na calçada é algo trivial, mas requer cuidados. O calçamento nem sempre é nivelado, as garagens nem sempre são devidamente sinalizadas, alguns carros estacionam sobre a calçada obrigando o pedestre a ganhar a rua, e as vezes a altura do meio fio exige esforço complicado para crianças e idosos. Olhos e ouvidos atentos, os pais com muita atenção tiram esse desafio de letra.

Vencido o passeio na calçada, em alguma momento chega a travessia. Essa é perigosa para todos. Vale a regra de esperar o sinal e atravessar na faixa. As vezes o tempo para travessia exige que o adulto puxe a criança, quase corra. Nesse caso é válido lembrar aos motoristas que o sinal estar aberto não legitima investir contra os pedestres, e crianças e idosos caminham em tempo diferente, é preciso parcimônia. No caso de ruas em que os veículos podem trafegar em alta velocidade os sinais e faixas são substituídos por passarelas. E a passarela precisa ser usada, de mãos dadas, cuidando para que as crianças não se pendurem aqui e ali para ver o movimento dos carros lá embaixo. Para os adultos pode parecer claro e objetivo que a passarela é um recurso para ele ir de um lado ao outro, mas para as crianças ela pode facilmente parecer um brinquedo, uma aventura, qualquer coisa divertida que aguça a curiosidade.

Seguindo, se o passeio for mais distante é necessário o uso do transporte público. Aí a situação pode complicar um pouco. Para pegar um ônibus com duas crianças é fundamental paciência e equilíbrio. Fazer sinal para o ônibus, embarcar cada uma das crianças, pagar a passagem, proteger as crianças para que se sentem se houver lugar, ou se segurem para não caírem nas arrancadas do percurso. Nos ônibus não há assentos apropriados, cintos de segurança ou barras de apoio em altura boa para as crianças. A população em geral até colabora, sede lugar, segura as crianças, mas a condução definitivamente é hostil a ela.

E o que dizer dos trens metrô? É bem mais tranquilo pagar pelo transporte e passar nas roletas com as crianças. Mas e aquele famigerado vão entre o trem e a plataforma? Já testemunhei adulto cair travado naquele vão me assegurando que o perigo não é uma lenda urbana. Se para adultos é uma temeridade, imagina para as crianças! As composições tem tamanhos variados, fazendo maior ou menor esse vão, mas o perigo de cair ou tropeçar é o mesmo. Pulando o vão, o que dizer do tempo para embarcar nos vagões? Enfim, tem que ficar muito atento para embarcar com rapidez e segurança. E assim como no ônibus é fundamental contar com a boa vontade da população para dar assento às crianças. E caso ocorra de ficar em pé, é prudente se afastar das portas que podem prender os pés, as mãos ou objetos, e a cada estação proteger as crianças para que não sejam arrastadas pelos que saem ou entram.

E então, curtiu a véspera de feriado? Foi bom levar as crianças para passear? Pois bem, todos esses parágrafo para refletir como a ideia de privar as crianças do urbano tem muito mais aderência do que a de tornar o urbano acessível para as crianças.

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