A saia justa é o uniforme da modernidade

O cenário da modernidade é o da instabilidade. Tudo é volúvel, guiado por uma dinâmica cujo fluxo não temos controle. Dito isto imaginemos duas situações. A primeira uma reunião de família e a outra uma de amigos.

Mesa posta, várias comidas, um burburinho vindo da cozinha, pratos e talheres já a postos, a televisão na sala sendo zapeada sem que ninguém fale nada, até que a comida é posta na mesa. Começa aquele vamos nos sentar, vamos comer, vem pra cá, vem fulano, chega pra lá e todos se servem e se acomodam. Entre o ruídos dos talheres, surge um minuto de silêncio. Logo olham para o ser que tem entre 20 e 35 anos e perguntam: e aí, o que você ta fazendo?

O sujeito para de comer na hora, pensa em como compor um discurso que não vá causar choro ou pânico na família. Dá uma pausa e fala que está com um contrato temporário de seis meses numa empresa.

Não entendendo bem o avô pergunta se tem carteira assinada. A pessoa inquirida quase morre, pois essa tal carteira de trabalho mencionada é o tipo de documento que ele usa pra calçar a televisão do quarto. É o máximo de utilidade que ele conseguiu arranjar pra carteira.

O sujeito fica muito constrangido, chama a mãe no canto e diz: ta vendo, era por isso que eu não queria vir. Fica todo mundo me pressionando, me perguntando, me cobrando isso e aquilo. A mãe pede desculpas, como se de fato alguma culpa tivesse, e volta pra mesa dizendo que o trabalho do filho, embora seja temporário paga muito bem e que ele tem até algo melhor já em vista.

A situação é a de um barzinho. Um bando de amigos se amontoam numa mesa, disputam aos gritos quem fala mais bobeira, bebem bastante e chegam naquele ponto em que o grupo vai dissipando e a mesa do botequim torna-se divã de analista. Um olha para o outro e dispara:

- e aí, como que ta sua relação com a Silvia?

Ao que o amigo responde:

- Na boa, mas terminamos já tem um mês.

- Ah, desculpa.

- Não, tudo bem. E você e a Alessandra?

- Casamos!

- Que maravilha. E têm filhos?

- Ela tem, eu não.

- Eu não sabia que ela já tinha filhos.

- Não, ela teve por esses dias. Me chamou pra ser padrinho, mas acho que não vai dar, pois to pretendendo voltar com ela. No caso o papel de padrasto já ta de bom tamanho.

- Mas e aí, você ta trabalhando?

- Não. Claro que não. Mas meus pais me sustentam e estão doidos pra ter um neto. Acho que vou dar essa alegria pra eles.

- Alegria ou despesa?

- As duas coisas!

Ambos saem dão o assunto por encerrado. Chega de bebedeira, pedem a saideira. Depois de quatro saideiras acompanhadas de um silêncio sepulcral, pedem a conta, pagam e vão embora, cada qual pra um canto. Ambos pensavam o quanto o outro era entrometido, que fica perguntando tudo, achando isso ou aquilo bom ou ruim, cheio de opiniões que não queriam ouvir, afinal, ninguém tem nada a ver com isso.

E é assim a modernidade! Ela nos deixa ressabiados o tempo inteiro. Nos dá tanta liberdade quanto aprisionamento. Sequer sabemos como agir mediante a tantos avanços de um lado e retrocessos de outro.

E então, qual a pergunta mais saia justa que você tenta fugir, seja feita pela família, seja feita pelos amigos. No meu caso são três: ta trabalhando? Quando vai casar? E aí, não vai ter filhos?

Comentários

Bill Falcão disse…
Sim, te direi algo: as perguntas básicas são essas mesmas aí. Ouço desde...nem lembro!
Quando as férias chegarem, dá uma passada lá na redação, onde a senhorita vai encontrar várias de suas amigas de blogosfera!
Bjooooooooo!!!
Patrícia disse…
"E é assim a modernidade! Ela nos deixa ressabiados o tempo inteiro. Nos dá tanta liberdade quanto aprisionamento. Sequer sabemos como agir mediante a tantos avanços de um lado e retrocessos de outro".

Se tem algo que me deixa muito p* é a minha irmã me perguntando a cada prova qual a nota que eu tirei, sendo que o que importa mesmo é se eu aprendi ou não. Sou bem estudiosa, mas procuro não medir o meu conhecimento por nota, enquanto ela usa isso de parâmetro para quase tudo. Minto na maioria das vezes que falo das minhas notas. Às vezes aumento noutras diminuo, vai depender do meu humor. Mas se eu não falo das minhas notas nem pra minha mãe, vou falar pra ela porquê? Nan!
Lomyne disse…
Nossa, eu sou a primeira a correr pra longe de qualquer evento familiar... As minhas perguntas odiosas são várias, mas a que mais me irritam são: tá namorando? e aquele cara com quem você tava? você engordou, né? aaaaaaaah, que vontade de mandar &%$#@&%...
Lomyne disse…
E quanto à sessão nostalgia, bom demais! Você me deixou cantando lá-lé-li-ló-lu patinadoraaaaa... Não tenho tantos a menos que você não, só um cadinho!
Tell Aragão disse…
váriasssssssssss
a) tá trabalhando?
b) quema rranjou esse trabalho? (por que tem que ser sempre alguém que arrumou e não você que conseguiu?)
c) eles pagam bem? quanto?
d) já recebeu?
e) por que separou?
f) por que não deu certo?
g) e aí, tá com namorado?
e por aí vai...
Ah, mas são essas perguntas, hum, indiscretas, q rendem as melhores risadas/piadas (desde q a(s) pergunta(s)não seja direcionada pra vc... Se não for, ae tá valendo...hehehe...)

Bjus!!!
Cau Bartholo disse…
Oi Pitty, tudo bem querida???
Gostei muito do texto só pra variar...
eu sou muito família e muito de amigos também, legal como desenrolou o fato...
sabe qual a pergunta que mais odeio? E ai fulano, ta namorando, ainda estão juntos! Isso porque troco de amor que nem troco de roupa hahaha...
BEIJOS bom fim de semana.
Oi!

Passa lá no meu blog, tem post novo!=)

Bjus!!
Oi!

Passa lá no meu blog, tem post novo!=)

Bjus!!
Nathália E. disse…
Olha, encontro familiar é o pior.
Eu fiz vestibular em 2006 e a pergunta da vez era: "Passou?"
Quando respondi que não, disseram: "E vai fazer o que da vida agora?"
Nossa, vontade de matar todo mundo.
Hahahaha

E agora que passei pra faculdade, a pergunta é: "Começa a trabalhar quando?"

Socorro!
Malu Azzoni disse…
As piores perguntas normalmente vêm da família.
Talvez até pq com alguns familiares, não temos nenhuma intimidade para responder qualquer coisinha.

As que mais me irritam, são aquelas tipo 'lembra, na quarta série, quando seu boletim era perfeito?'. Ou 'porque a sua amiga é assim (blábláblá) e vc não?' Tipo, odio comparações.

Mas adorei aqui, vou te colocar nos favoritos, okay?

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